Inútil é o amor que tenho por você

(...)
- Lembre-se de alguma coisa inútil e provavelmente será isso que estarei fazendo. Ouça, Virgínia, é preciso amar o inútil. Criar pombos sem pensar em comê-los, plantar roseiras sem pensar em colher rosas, escrever sem pensar em publicar, fazer coisas assim sem esperar nada em troca. A distância mais curta entre dois pontos pode ser a linha reta, mas é nos caminhos curvos que se encontram as melhores coisas. Este céu que nem promete chuva... Aquela estrelinha que está nascendo ali... Está vendo aquela estrelinha: Há milênios não tem feito nada, não guiou os Reis Magos, nem os pastores, nem os marinheiros. Não fez nada. Apenas brilha. Ninguém repara nela porque é uma estrela inútil. Pois é preciso amar o inútil porque no inútil está a Beleza. No inútil está Deus.
     Virgínia apertou o ramo de rosas contra o peito. "Inútil é o amor que tenho por você" - quis dizer-lhe. Não disse. Aquela foi uma hora de paz, a mais leve ironia poderia embaçar sua transparência. Parecia sentir ainda a leve pressão dos dedos de Conrado no seu braço. Mais tarde haveria de lembrá-lo assim, todo feito de palavras e de gestos inúteis. Mas inesquecível. (...)

Lygia Fagundes Telles

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